sábado, 15 de novembro de 2008

O casal simbiótico

Rapaz e Donzela não se conheciam, mas tinham um amigo em comum. Se encontraram no aniversário dele, num bar, e começaram a conversar. O papo fluía bem, um assunto trazia naturalmente outro e mais outro. Donzela falou sobre o show que ela estava doida pra assistir, enquanto Rapaz escutava com total atenção. Quando deu 11 horas, Rapaz avisou que precisava ir embora porque tinha prova no dia seguinte e eles trocaram telefones. Alguns dias depois, marcaram um cinema. Donzela estava ansiosa, mas tudo saiu bem. Na despedida, trocaram um beijo que deixou cada um com um sorriso imenso no rosto na volta pra casa. Daí em diante, os encontros foram se tornando mais e mais freqüentes e, em pouco tempo, estavam namorando.

Eles eram mesmo um casal lindo. Se tratavam cheios de mimos e a felicidade deles por estarem juntos era tão grande que dava até para ignorar os apelidinhos bregas que eles usavam pra chamar um ao outro. Um dia, aquele amigo em comum foi mandar um recado para Rapaz no Orkut e viu que seu perfil havia sumido. Estranhamente, o de Donzela também. No dia seguinte, "Donzela & Rapaz forever" pedia autorização. O amigo achou meio esquisito, mas não imaginava que aquele era só o começo. O próximo sinal do que estava por vir foi quando convidaram Donzela para o teatro e ela disse:

- Poxa, eu queria tanto ir a essa peça... Pena que o Rapaz não vai poder esse dia. Tá levando trabalho pra casa, sabe?

Daí em diante, um só saía se o outro pudesse ir também, mesmo que o convite se estendesse a apenas um deles. Até mesmo os programas em que iam juntos começavam a rarear, já que agora eles preferiam dedicar qualquer tempo livre à intimidade do casal. Se telefonavam o dia inteiro, ou porque Donzela queria contar ao "môzinho" sobre uma piada super engraçada da colega de turma ou porque Rapaz "só queria dizer 'eu te amo' ".

Quando falava com amigas, Donzela encaixava a cada quinze seguntos comentários que começavam com "o meu namorado". Já não usavam mais o pronome "eu" ao responder a uma pergunta ou convite; só diziam "nós" ou "a gente". "A gente adora pizza no forno a lenha!". "Não, obrigado, vinho sempre deixa a gente meio tonto...". "Nós torcemos pelo Obama como se a eleição tivesse sido aqui no Brasil!". Os conhecidos agora evitavam a companhia do casal e sobreviviam às longas conversas balançando a cabeça afirmativamente e dizendo "um-hum" para tentar encurtar o suplício.

Era fato: Rapaz e Donzela haviam se tornado um casal simbiótico. Ali não existiam mais dois indivíduos autônomos, mas um organizmo humano semelhante ao de irmãos siameses, só que formado por dois corpos independentes. Quer dizer, em teoria. Na prática, eram incapazes de tomar uma simples decisão - como se o bolo de aniversário da mãe do Rapaz devia ser de brigadeiro ou crocante - sem o aval do outro.  Outro dia, uma amiga veio me contar que eles terminaram. Vai entender, né?

4 comentários:

Amandla Awetú disse...

Vai entender?
Verdade, mas essas coisas só acontecem no ínicio do romance, não acha?
Lembra o que conversamos ontem, nao?
Bem essa coisa. Acho que em qualquer romance, as pessoas devem ser independentes. Sinceramente?um confia no outro, e, a 'unica coisa que um tem, para que o outro confie, 'e a palavra. Pronto. Vc sai sozinho, com seus amigo. eu saio sozinha, com minhas amigas. Aproveitamos a noite. No final, a gente se encontra. Conversa e transa. Ponto.
As coisas devem ser assim. pELO menos pra mim.

Anônimo disse...

totalmente compreensível. na verdade, rapaz e donzela fizeram um grande bem a humanidade se separando.

Felipe Melo disse...

Da wikipédia:

"Simbiose é uma relação mutuamente vantajosa entre dois ou mais organismos vivos de espécies diferentes. Na relação simbiótica, os organismos agem ativamente em conjunto para proveito mútuo, o que pode acarretar especializações funcionais de cada espécie envolvida.

Há alguma indefinição nos conceitos associados a este termo. Assim, a simbiose implica numa inter-relação de tal forma íntima entre os organismos envolvidos que se torna obrigatória. Quando não existe obrigatoriedade na relação, dever-se-á utilizar antes o termo/conceito protocooperação."


Mas observem, eles se separaram. Não precisavam realmente um do outro. Eram um casal protocooperado. hehehehe
(não, não precisa mudar o título, ficou ótimo).

Luanda Lima disse...

Nerd.