terça-feira, 13 de maio de 2008

De volta ao princípio


Um amigo me emprestou "As estrelas-Mito e sedução no cinema", do Edgar Morin, há algumas semanas. Ainda não o li, mas olho pra ele todos os dias (deixei-o bem ao lado do monitor do PC, pra não esquecer de pegá-lo assim que sobrar um tempinho). Olhando hoje para a capa, lembrei das muitas análises que fazemos sobre o cinema.
Não estou me referindo só a aspectos "teóricos" (imaginário, características sociais, posicionamentos políticos etc), mas também aos dados técnicos, como figurino, fotografia, roteiro e montagem. Eu mesma acho interessantíssimo observar um filme de maneira mais aprofundada e perceber aspectos não-óbvios.
Apesar disso, acho que parte da magia se perde, do interesse inocente e genuíno, da atenção despreocupada e, por que não, infantil. Minha mãe conta que me levou pela primeira vez ao cinema quando eu tinha uns 3 anos, para assistir a uma animação em que objetos iam se transformando sucessivamente. Ela conta que eu acabei com a paciência de todos os outros espectadores (não acho que o filme fosse dedicado especificamente ao público infantil) porque, extasiada, ficava dizendo "olha, mamãe, a árvore virou um passarinho, agora um avião, agora um peixe...".
Ainda lembro vagamente (socorro, estou ficando senil) de como era assistir a um filme e literalmente esquecer do resto do mundo, porque naquele momento, só importava a história da Cinderela e de como ela iria mostrar ao príncipe que era a legítima dona do outro sapatinho de cristal. Sem teorizar, relacionar, refletir, apenas me deixando absorver pelo filme.
Era bom pensar que a vida tinha um sentido lógico, os bons eram recompensados e os maus punidos, que os casais apaixonados viveriam felizes para sempre, que as diferenças não eram nada frente a sentimentos verdadeiros. E só.
Pensando a respeito, lembrei de "Cinema Paradiso", a que assisti no ano passado. O filme conta de uma maneira muito delicada e lírica sobre um menino (Totó) que se encanta com o cinema ao se tornar amigo de Alfredo, projecionista da única sala de exibição da cidade. Depois de ter se tornado adulto e diretor de cinema, Salvatore (Totó) volta à cidade natal, que não visitava há anos, quando sua mãe liga para avisar sobre a morte de Alfredo. A seqüência final (inesquecível) mostra a fusão entre adulto e criança, entre racionalidade e emoção, entre consciência e encantamento frente ao cinema.
Hoje não consigo mais alcançar essa sensação, já começo a assistir a um filme pensando " o figurino é uma referência ao filme tal", "esse perfil de personagem é recorrente na obra do diretor X" ou "por que essa ou aquela prática é sempre mostrada de forma negativa ou positiva?". Sei que minha bagagem cultural e maturidade são diferenciais importantes, mas sinto falta de me deixar envolver pelo cinema como uma criança de novo.
Às vezes vejo essas saudades como crises sem sentido de nostalgia que vêm chegando na pontinha dos pés até se unirem com tantas outras e me tomarem por inteiro em forma de melancolia. Às vezes, como wake-up-calls sobre sensações das quais fui me esquecendo com o tempo, mas que ainda posso reaver. Ainda não sei se consigo ver novamente o cinema com os olhos fixos e brilhantes de Totó, mas continuo chorando no final de "Uma Linda Mulher", não dormindo à noite com medo da Samara e rindo das trapalhadas do Chaplin. Deve ser um bom sinal.


5 comentários:

Anônimo disse...

eu gosto de quando as luzes apagam, logo me vem esta sensação de esquecimento do mundo lá fora. parece que há um retroprojetor do meu coração para a tela. adoro.

well well well
bad bad server no donut for you
deletei meu orkut
Mas não se preocupe, o mundo não acabou, eu ainda existo. Fora dos sites de relacionamento, mas existo. Gostou do CD da keren ann?

Luanda Lima disse...

Mais uma que acha que vai abandonar o mundo pós-moderno excluindo o orkut...rs
Baixei o "Not going anywhere", que é beeeem legal. Não consigo parar de ouvir a música-título. Sabe quem me lembra? Kimya Dawson (aquela que faz quase toda a trilha de "Juno").
Ah, você já ouviu Cat Power, Damien Rice e Jeff Buckley?
Se não, procura que eu acho que você vai gostar (mais músicas tristonhas e lindas).
Bitocas

Unknown disse...

Bom há alguns dias me indaguei sobre essas questões. Pensei nelas antes de ter lido seu blog. Durante todo o dia primeiramente numa ilha gélida de edição de videos e num outro momento na sala de aula da faculdade de cinema, me veio a lembrança do primeiro filme que eu vi: tartarugas ninjas, em que fui no cinema com meu pai e minha mãe e como era muito pequeno ficava mto encolhido na poltrona do cinema, sem enxergar corretamente o filme, mas muito atento às cenas em que as tartarugas caminhavam nos esgostos e na estação de metrô abandonada.. Não sei se isso é relevante, mas naquela época, sem o senso crítico que finjo possuir hj, creio que era mais feliz. Poderia fantasiar e me ater somente a dramaturgia das tartarugas, sem pensar muito que o golpe projetado pelo destruidor contra as tartarugas era feito na época com o back project ou com o mais toco dos chroma keys. Se a unanimidade é burra, e a felicidade geralmente é um bem sentimento interpretado por muitos da mesma forma... então a unanimidade burra, que assiste aos filmes pipoca, pode muito bem ser feliz num âmbito lúdico-cinematográfico.

Luanda Lima disse...

Oi,Otto
Lembrei te ter visto um filme das Tartarugas Ninjas quando era criança também! E de ter achado ótimo...afinal,não tem nada de estranho com ratos de 2m e tartarugas falantes com nomes de pintores italianos.
"Se a unanimidade é burra, e a felicidade geralmente é um bem sentimento interpretado por muitos da mesma forma... então a unanimidade burra, que assiste aos filmes pipoca, pode muito bem ser feliz num âmbito lúdico-cinematográfico". Digna de moldura.

Anônimo disse...

sii-im!
depois que assisti o filme corri disparada para baixar todas da kimya! adorei.

já ouvi algo do cat power e gostei bastante. irei baixar damien e jeff, depois te conto gatinha!