terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Vida de gado

"Tia, compra um chiclete pra mim ir almoçar?", diz o moleque de chinelos encardidos. "Desculpa, eu não tenho nada aqui" respondo como sempre, numa mistura de culpa, pressa e medo de ser assaltada.
"Moça, dá um dinheiro pra eu comprar leite pra ele?", diz a moça esparramada na escada do metrô, com um bebê maltrapilho no colo.
Finjo que não escutei e passo com pressa, tentando afastar aquela visão o mais rápido possível e continuar o meu dia sem pensar nela.
Barulho de moedas quicando numa lata. O velho cego e miserável sentado do lado de fora da loja não diz nada. O meu procedimento é igual ao anterior.
Ou ainda o rapaz que grita "água, coca-cola, guaravita e H2o" na beira da estrada. Está um calor infernal dentro do ônibus, mas sempre imagino que o sinal vai abrir antes que eu consiga pegar a água.
Trabalho 9 horas por dia em frente ao computador, na minha mesinha, trancafiada no escritório. À noite, mais 4 horas na faculdade. Ou seja, geralmente só passo na rua quando estou me deslocando pra esses lugares ou pra casa. Mesmo assim, encontro diariamente uma multidão marginal, vivendo de caridade, pequenos furtos e dos restos alheios. Ignorante e ignorada. Fico pensando que tenho que fazer alguma coisa, mas o quê? Penso, então, que alguém deveria fazer, mas quem? Por uns 30 segundos, fico pensando que posso dar dinheiro, mas que este vai ser gasto com alguma besteira, que chega no final do dia e a mulher devolve o bebê pra mãe antes de voltar pra casinha dela ou que vou alimentar um círculo vicioso de miséria. Por minha culpa, a pessoa nunca vai sair dali. Lembro do cara que estava pedindo dinheiro em frente à UERJ e que, quando ofereci a maçã que estava na minha mochila, riu. Acabo passando direto. E depois esqueço.

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